segunda-feira, 17 de outubro de 2011

SOBREPESO E OBESIDADE II - CAUSAS

               Grande número de pessoas liga o processo de sobrepeso à ingestão excessiva de calorias e à falta de alguma atividade física que queime essas calorias em excesso. Realmente, se estamos ingerindo mais calorias do que gastamos ao longo do dia, haverá uma "sobra" de energia que o nosso organismo irá converter em gordura, a ser armazenada no tecido adiposo. Essas pessoas estão certas, não há como discutir isso. Mas, e quanto àquelas pessoas que comem corretamente, sem excessos, se exercitam regularmente em vez de serem sedentárias e, mesmo assim, estão ganhando peso progressivamente? Nós, médicos, ficamos um pouco confusos quando recebemos pacientes com este perfil nos nossos consultórios. O que está ocorrendo a essas pessoas? Como podemos ajudá-las? Existem outras causas, além das acima expostas, que podem causar um sobrepeso progressivo e não responder às medidas clássicas de dieta e exercícios? A resposta é: sim, existem. E nós vamos, aqui, analisar essas causas, o que promove seu aparecimento e como elas agem, às vezes insidiosamente, nos nossos organismos, nos levando a engordar, apesar dos nossos melhores esforços em contrário.

               O Framingham Heart Study, conduzido pelo Dr. Vasan e publicado no journal Annals of Internal Medicine de 2005, acompanhou um grupo populacional, inicialmente com 30 anos de idade, durante várias décadas. Todos os homens e mulheres acompanhados tinham o peso normal ao início desse estudo e, ao final do mesmo, 90% dos homens e 70% das mulheres tinham desenvolvido Sobrepeso ou Obesidade. A conclusão do Dr. Vasan foi que envelhecer causa aumento progressivo de peso na maioria absoluta das pessoas. Vamos entender como isso acontece.

            Nós atingimos o ápice do desenvolvimento físico aproximadamente aos 22, até 25 anos, e nos mantemos fisiologicamente equilibrados até os 30 anos, mais ou menos. Quero deixar claro que estamos nos referindo àquelas pessoas que mantêm estilos de vida relativamente saudáveis, sem grandes excessos. Ao atingirmos 30 anos de vida, os nossos hormônios começam um declínio lento e progressivo, que pode passar desapercebido por 1, talvez até 2 décadas. Isso ocorre porque nosso organismo tem uma razoável capacidade de manter o equilíbrio interno. Assim, os hormônios vão caindo, e os seus respectivos receptores hormonais nas membranas celulares vão sendo "desligados", até que cruzamos o "ponto de equilíbrio" e os primeiros sinais de senescência aparecem. Uma ruguinha aqui, um cabelo branco acolá, e as indesejáveis gordurinhas aumentando e deformando nossa silhueta.

               O esquema abaixo mostra como as alterações hormonais relacionadas à idade levam ao sobrepeso:
   
AUMENTO DA IDADE
ALTERAÇÕES HORMONAIS
REDUÇÃO DA ATIVIDADE ENZIMÁTICA                      
REDUÇÃO DA ATIVIDADE TERMOGÊNICA
DIMINUIÇÃO DA TAXA METABÓLICA BASAL
GANHO DE PESO


               Quais os hormônios que, quando alterados, influenciam o ganho de peso e como eles agem?

- Cortisol - estimula a liberação de glicose na corrente sanguínea e o posterior armazenamento da mesma como gordura no tecido adiposo, particularmente do abdome. Causa perda de massa muscular, levando a queda da Taxa Metabólica Basal e da Termogênese.

- Testosterona - sua deficiência contribui para a perda de massa muscular e a queda da taxa metabólica basal (em repouso) e durante atividade física.
 
- Estrogênios - estimulam acúmulo de gordura em quadris, cintura e mamas em homens, e em cintura, coxas e glúteos em mulheres.

- Progesterona - quando alterada, eleva níveis de Cortisol, aumenta a resistência à Insulina, estimula o apetite e o desejo por carboidratos e favorece a deposição de gordura corporal.
  
- DHEA - sua deficiência acelera o processo de envelhecimento e favorece a deposição de gordura abdominal (visceral).

- HGH (hormônio do crescimento) - quando deficiente, favorece perda de massa muscular e acúmulo de gordura em cintura e quadris.
  
- T4 e T3 (hormônios tireoidianos) - a queda desses hormônios leva a redução importante do gasto calórico em repouso e durante atividade física, deixando o metabolismo bastante lento.
 
- Melatonina - sua deficiência favorece o envelhecimento e a resistência dos receptores hormonais e causa irregularidades no padrão de sono. A insônia é um fator de aumento de Grelina, um hormônio estimulante do apetite.
  
- Dopamina - ligada ao centro cerebral do prazer, quando alterada causa desejo excessivo por comida e vícios alimentares.

- Incretinas, Insulina, Glucagon - atuam no metabolismo de carboidratos, proteínas e gorduras, interferindo no apetite.
 
- Adrenalina - estimula a degradação de triacilgliceróis (gorduras) armazenados no tecido adiposo para produção de glicose, elevando a glicemia. Regula o metabolismo do Glicogênio.
  
- Colecistoquinina (CCK) - reduz a velocidade de esvaziamento gástrico, prolongando a sensação de saciedade.
  
- Leptina - quando alterada, não envia a mensagem de saciedade durante as refeições, necessária para o cérebro inibir o apetite. Assim, a pessoa come bem mais do que necessita pois o cérebro não percebe a saciedade.

- Neuropeptídeo Y (NPY) - estimula o acúmulo de gordura no tecido adiposo e o aumento das células adiposas.
 
- Grelina - promove o apetite.
  
          Além do processo de envelhecimento, outros fatores podem alterar os diversos hormônios acima, causando sobrepeso progressivo. São eles Estresse (já discutido no texto Como o Estresse nos faz engordar), dietas de fome ou nutricionalmente incorretas, doenças que atingem o metabolismo (como Hipotireoidismo e Síndrome de Cushing), medicamentos (como Corticóides, Anticoncepcionais e Antidepressivos) e sono irregular.

          Fugindo um pouco do assunto em questão, faremos uma pequena colocação sobre hábitos alimentares indevidos. A dieta ocidental moderna, rica em carboidratos refinados e substâncias estimulantes, é fator causador de Hipoglicemia Reativa que, mais do que estimular uma fome "rebote" e vícios alimentares difíceis de controlar, pode levar a ataques de Pânico. Dietas muito restritas, com pouca proteína, nenhum carboidrato ou pobres em nutrientes como Zinco, Cromo, Magnésio e complexo B (essenciais ao controle dos níveis de glicose) também podem levar à hipoglicemia reativa.
  
          Dito isso, voltamos a falar de sobrepeso. Um dado importante que não pode ser esquecido: as alterações hormonais que levam ao sobrepeso nem sempre são de deficiência ou excesso de produção hormonal. É essencial lembrar que pode ocorrer resistência (ou insensibilidade) do receptor hormonal, que deixa de reconhecer o seu hormônio e não é ativado (não se acopla ao hormônio, não permitindo a sua ação fisiológica). De fato, há 4 tipos de resistências hormonais envolvidas no binômio sobrepeso/obesidade:
  
- resistência à Leptina - o cérebro não percebe os sinais de saciedade, o que leva a pessoa a comer em excesso,
 
- resistência à Insulina - leva ao metabolismo anormal da Glicose,

- resistência à Adrenalina - leva ao metabolismo anormal do Glicogênio,
 
- resistência aos hormônios tireoidianos - leva a uma queda da Taxa Metabólica Basal e a uma baixa Termogênese (facilmente verificada pela aferição da temperatura basal matinal).
  
           Nesse caso, o corpo sofre sintomas de deficiência hormonal e o cérebro emite sinais para as glândulas produzirem mais hormônios, já que não ocorreu o feed-back negativo esperado pelo cérebro.  Um fato a ser considerado sempre que os exames laboratoriais estão dentro da faixa de normalidade, mas incompatíveis com os sintomas e/ou sinais clínicos que o paciente apresenta, antes de rotularmos nossos pacientes de "deprimidos" e prescrevermos antidepressivos. Nada contra os antidepressivos, quando utilizados criteriosamente. Ocorre que eles podem inativar T 3, que é o hormônio tireoidiano metabolicamente ativo, e concorrer para o ganho de peso.

          De modo simplificado, podemos dizer que Sobrepeso e Obesidade são reflexos de um desequilíbrio metabólico causado por erros na comunicação hormonal no nosso organismo, envolvendo hormônios produzidos no Cérebro, em diversas glândulas (como Pâncreas, Tireóide, Suprarrenal, mucosas gástrica e intestinal) e nas células do tecido gorduroso. Sendo uma patologia multi-fatorial, seu tratamento envolve medidas várias, como correção de hábitos (alimentares, sedentarismo, sono), controle e manejo do estresse, reposição hormonal ou controle de alterações hormonais, e tratamento de qualquer doença de base que esteja contribuindo para o acúmulo de gordura corporal.

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